ENTREVISTA COM AUTORES #68 | Autor Paulo Moura
1 - Como você percebeu que queria ser escritor?
Não consigo precisar se o movimento foi esse, de perceber que queria ser escritor, mas acredito que fui capturado pela escrita depois de escrever o meu primeiro conto “Janela Quebrada”, que abre o meu primeiro livro: Cotidiano. Era domingo de manhã em algum momento de 2012, eu estava olhando para uma fotografia e me veio à mente uma história para aquela personagem estampada na foto que havia me deixado tão fascinado. Liguei o computador e escrevi em menos de dez minutos, como se já estivesse pronto, só precisa ser jogado no papel. Talvez ele, de fato, já estivesse pronto, eu fui só uma ferramenta que deu forma em verbos e predicados àquela história que estava querendo escapar. Foi assim. Depois, o inscrevi em um concurso e fui finalista; e aí, depois dele vieram outros e outros vêm até hoje. Sorte a minha. (risos).
2 - Tem algum personagem favorito? Em modo geral ou dos seus livros? Se sim, por quê? O que ele significa para você?
Tenho alguns, e cada um por uma razão diferente. Sou apaixonado por Werther, do Goethe, pela importância do personagem e da obra protagonizada por ele. Os Sofrimentos do Jovem Werther dá início a um dos movimentos mais importantes da literatura; preciso dizer que é o meu favorito. Gosto bastante da Olga de Dias de Abandono, da Elena Ferrante, pelo que ela e o livro me faz sentir; a sabor nostálgico da solidão inevitável. Fico admirado com a construção impecável do Jörgen Horfmeester, do autor holandês Arnon Grunberg, no angustiante “Tirza”. Não posso deixar de falar do bando de Pedro Bala, os Capitães da Areia do brilhante Jorge Amado, uma obra que é leitura obrigatória para todo brasileiro e que permanece atual aos dias de hoje. Poderia citar tantos outros de Machado, Ariano Suassuna, Pedro Juan Gutierrez, das irmãs Brontë, Gabriel García Márquez, Rubem Fonseca, Nelson Rodrigues, Luiz Berto — meu conterrâneo—, autores que, de certa forma, construíram uma literatura inquietante, provocadora e reflexiva; a literatura como uma potente e subversiva ferramenta de transformação social.
3 - Como foi para você, entrar no mundo literário?
Não foi fácil, mas mais por resistências pessoais que por impedimentos externos. Era muito difícil, para mim, me enxergar enquanto escritor/autor. Quando escrevi o primeiro livro, que intitulei de Cotidiano, não tinha a mínima esperança nem a pretensão de publicá-lo, no entanto, com o apoio de alguns amigos, enviei o material para algumas editoras e, para minha surpresa e indescritível alegria, aceitaram. E antes mesmo da edição dele, eu já estava escrevendo outros contos, agora, com a clara pretensão de publicá-los. Foi assim quer nasceu o “Transa”, lançado no mês passado pela Helvetia Éditions. Desde então, costumo escrever diariamente e com a mesma paixão. Não sei precisar para você o que seria essa coisa de “ser escritor”, mas tudo que sei é que não há nada no mundo que me dê mais prazer do que escrever. Talvez isso seja ser escritor. Escrevo porque escrevo e isso me basta.
4 - Você faz muitas pesquisas antes de escrever uma história?
De uma forma sistemática, não. Acredito que uso muitos elementos de outros autores, do cinema e também da música, mas como um aparato a mais para desenvolver os conflitos entre os personagens. Gosto de trabalhar com o elemento humano em meus contos. Raramente, para não dizer nunca, disponho os textos em algum lugar ou cidade específica, pois não faria diferença. São conflitos ordinários que poderiam se passar tanto em Recife, cidade onde moro, quanto em Budapest; que nunca fui.
5 - Existem muitas cobranças por parte de seus leitores?
Não sei se seriam bem cobranças, mas costumam perguntar bastante se os textos são autobiográficos. De uma certa forma, são. Ainda que não sejam. Acredito que é muito difícil se desvencilhar de si mesmo para escrever, não importa o quanto de fantasia que usemos para florear os textos, inevitavelmente haverá muito do autor ali. É uma explícita exposição de si para um outro que vai ler; é o leitor que faz a literatura. Os textos não pertencem a quem escreve, mas a quem mais precisa deles.
6 - Fale um pouco sobre sua forma de criação... Possui alguma mania na hora de escrever?
Escrever é um ato muito solitário, mas de uma solidão reconfortante, quiçá necessária. Atualmente, prezo muito esses momentos, mas nem sempre é assim. Costumo escrever em qualquer lugar. Cotidiano, por exemplo, com exceção do primeiro conto, foi todo escrito no celular durante o percurso que eu fazia de casa para a faculdade, sentado no metrô ou em pé no ônibus lotado. Foi a forma mais agradável que eu encontrei de passar as viagens diárias. Observando, como um bom curioso, as conversas ao meu redor, onde sobressaia uma frase ou uma palavra específica que, posteriormente, dava vida a um dos meus personagens.
7 - Quais são seus projetos para um futuro próximo?
Escrever um romance e adotar um cachorro, não necessariamente nessa ordem.
Gostaria de deixar algum recado para os leitores do Lost Words, e para seus futuros leitores?
Primeiro gostaria de agradecer pelo espaço concedido, muito obrigado, é uma oportunidade maravilhosa de divulgar o nosso trabalho, sobretudo para os iniciantes, como eu, no mundo das publicações literárias. Aos leitores do Lost Words, os convido para conhecerem o meu trabalho e fiquem à vontade para compartilhar comigo suas impressões, gosto de saber o que as pessoas acham ou sentem quando leem os meus contos.
Sobre o autor:
Paulo Moura nasceu no município de Palmares, na zona da Mata Sul de Pernambuco, cidade berço de personalidades ilustres e renomadas como o poeta Ascenso Ferreira e o escritor Hermilo Borba Filho. Aos 18 anos, mudou-se para o Recife, onde começou a brotar sua escrita. Em 2012, foi finalista no VII concurso de contos do Tijuco “Whisner Fraga”. Em setembro de 2018, publicou Cotidiano, seu primeiro livro de contos e em 2019, Transa, pela Helvetia Éditions.
Sobre suas obras:
Cotidiano (2018)
Transa (2019)
Sinopse da Editora: Transa é o segundo livro do contista Paulo Moura, reunindo textos de prosa poética; por vezes, seca, erótica, direta. Retrata casos de um cotidiano despedaçado pela crueza dos afetos em atitudes das mais banais. Personagens ciumentos, paranoicos, resignados, violentos misturam-se num caldo do que há de mais humano. É um livro que fala de amores, desamores; afetos e desafetos. Transa, enfim, é uma obra que desvela o ser humano em suas dores mais íntimas, ainda que na liberdade dos desejos mais encobertos.
“[...] Tornou-se, assim, um hábito. Um hábito que estava me despedaçando dia a após dia.” Em Transa, nos deparamos com a harmonia entre laços rompidos de amores despedaçados e a poesia dos amores que se iniciam. Com uma linguagem que trafega entre o poético e o erótico, o autor vai desnudando cada personagem, levando-os ao limite da contradição de seus desejos.
Beijos!
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